29 de Outubro a 28 de Novembro, 2015

Declaração de Márcia Bellotti:

Desde 2014, meu trabalho sobre sexualidade com voluntários me levou a uma problemática comum: o cerceamento das liberdades individuais, sobretudo a partir do período da infância.

A construção das identidades ocorre mediante repressões e obstruções em um lento processo que começa antes mesmo da criança saber andar. Desde o útero materno, as projeções de gênero são barreiras que se desdobrarão durante a primeira infância, pré-adolescência e adolescência, causando muitas vezes danos irreversíveis.

Como se portar. Como se vestir, falar, andar.
A correspondência arbitrárias das cores.
Os limites invisíveis entre gêneros.

Até o momento, todos que entrevistei, sem exceção, mostraram como essas forçosas adaptações sociais foram processos dolorosos que geraram feridas não-cicatrizáveis.
São questões que, ainda no presente, reverberam.

 Assim, partindo de um objeto simples surge uma performance também simples.
É a materialização em gestos de uma metáfora comum.

A PERFORMANCE

Realizada no dia 23 de julho de 2015.
Galeria MUTE. Lisboa, Portugal.
Apoio Arte Institute.

Sobre um pilar há um pequeno tabuleiro. Trata-se da base de um jogo que ensina às crianças as correspondências entre formas geométricas e cores. Há 16 peças, em 4 cores. O tabuleiro é classificado entre colunas e linhas, sendo as linhas em “1, 2, 3, 4” e as colunas em “a, b, c, d”.

As peças são seleccionadas de forma arbitrária através de sorteios.

Do primeiro recipiente, retiro um pequeno papel preto que contém informação sobre as coordenadas do tabuleiro.
Do segundo recipiente, retiro outro papel preto que informa qual peça deve ser utilizada.

Com a ajuda apenas de uma ferramenta, cola e pregos enferrujados, faço com que as peças se encaixem nas bases, independente de haver uma correspondência geométrica.

O primeiro passo é tentar fazer a peça encaixar usando apenas as mãos. A força vem do corpo. Posteriormente, temos o uso da ferramenta. A força vem das marretadas, exatas porém  contidas, que devem exercer pressão através da violência, mas de modo a evitar que outras peças sejam atingidas ou caiam através da vibração da base. Por fim, cola e pregos, como um desesperado ato final, últimos recursos disponíveis para fixar as peças que não se encaixaram na base por sua correspondência natural ou através do uso da força.

Uma a uma, as peças vão sendo sorteadas e encaixadas à base.

Ao fim de um período de cinco horas, todas as peças estão de alguma forma presas ao tabuleiro, e efectuadas todas as correspondências arbitrárias entre cores e formas.

Já com o braço exausto, executo um derradeiro golpe.
Desta vez não há mais tabuleiro, apenas uma base lisa de madeira. A ferramenta atravessa directamente e se prende na própria estrutura.”



www.marciabellotti.com

 

 


Opening

Video by Arte Institute, November 2015